Churros com Limonada

sexta-feira, fevereiro 23, 2007

Menos apaixonada

É triste, mas é verdade. Faltam-me sabedoria e clareza para afirmar se esta subtração é resultado do envelhecimento (uma forte suspeita minha). Ou se sou apenas eu...
Mas fato é: cada vez mais, me sinto menos apaixonada.

Por exemplo, o Vasco. Meu tão querido Vasco de outros tempos...Agora, pfffffffff!!!!...Não perco mais tempo sofrendo pelo time que, no passado, tanto me levava aos estádios. Que tantas boas recordações me traz. Mesmo quando elas são quase trágicas. Lembro de uma vez, na arquibancada do Maraca, adolescente ainda. Meu pai comprou um picolé Frost (alguém lembra?) de limão - meu sabor predileto. Um calorão e eu, ávida e gulosa, não pude nem aproveitar minha primeira lambida. De tão congelado, o sorvete imediatamente grudou na minha língua. Inacreditável, né?! E eu juro que é verdade. Me desesperei, comecei a puxar o palito, choramingando, e o resultado foi o um picolé de limão flocado de vermelho, com minhas bolinhas de sangue. Quase trágico, mas hoje acho esse episódio hilário no meu CV torcedora de arquibancada. E tenho até orgulho.

Também não me envergonho de, na década de 80, tantas e tantas vezes sair do estádio antes do fim do jogo porque o Vasco teimava em ser freguês do Fluminense. Era pequena, mas assisti a amargos 0 x 3; 1 X 3......Sem falar na vitoriosa fase do Flamengo. Tudo bem, eu não desistia. Sou testemunha, com orgulho, de Bob Dinamite, do camisa 8 Geovani, meu ídolo, e do baixinho gatinho Mauricinho. Eu devia ter uns 12 anos, mas era a fim dele, haha. Apesar dos pesares, via um futebol bonito. Nos 90, fui à forra. Títulos e mais títulos, vitórias inesquecíveis, uma chuva de gols e o maluco do Animal, que bateu recorde do esporte, fazendo seis numa só partida! E eu estava lá! Sabia que valia a pena. Eu era apaixonada.

Tão apaixonada que fiz até loucura. Ou quem trocaria uma noite promissora em Fernando de Noronha - isso, eu disse FERNANDO DE NORONHA! - por um jogo na tevê? Era o verão de 2000 - ai, ai! Conheci um povo fofo numa cavalgada cinematográfica pelas praias da ilha. Ainda em cima do cavalo, combinei com os novos amigos uma despedida no forró da vila do Cachorro. Fechado, "tchau, até mais tarde, com certeza!!!", e fui pro meu quartinho com ar e tv (parênteses aqui pra contar que, naquela época, as pousadas em Noronha ainda eram nas casas dos moradores e o forró do cachorro era o único point noturno, além das palestras do Ibama).

O "com certeza" durou até eu ligar, por descuido, a tevê. E descobrir que a Globo transmitia a final da Mercosul - Palmeiras X Vasco. Acabou o primeiro tempo, o Vasco perdia por 0 X 3 e vai entender por que motivo eu não desliguei o aparelho e parti pro bate-coxa nordestino?! Até hoje eu mesma mal consigo acreditar, mas, no fim das contas, guardo a melhor das recordações: numa virada indescritível e emocionante - sem o emprego banal deste último adjetivo - meu time empatou em 3 X 3 e, quando todo mundo já esperava pela decisão nos pênaltis, Romário fez 3 X 4 aos 38 do segundo tempo! "O Vasco é o time da virada....ôôô".
Foi o melhor jogo que meu coração cruzmaltino sofrido já assistiu na vida!
Nesta noite, só saí do quarto para comemorar no orelhão, com meu irmão. Eu explodia por dentro.

As paixões são mesmo incontroláveis. Era para eu escrever duas linhas sobre o Vasco. Mas me reapaixonei. Não pelo Vasco; só pelas minhas próprias memórias. Reafirmo que estou cada vez menos apaixonada. E, como tentava dizer, por tudo...em diversas áreas. Mas vou deixar pro próximo post, porque, pelo jeito, desse aqui não sai mais nada. Vai ser enrolada assim lá em Noronha, vai!

Pra terminar, um nota curiosa: acabei de receber um convite. Ir ao Maraca domingo para ver Vasco X Flamengo.

Primo Basílio para maiores

Não sei se foi a notícia de quem o livro vai ser adaptado para o cinema ou se a conversa com uma amiga, mas comecei a ler 'O Primo Basílio', de Eça de Queiroz. Edição antiga, emprestada pela minha avó. Lá pela página 150, Basílio tenta convencer sua prima e ex-namorada Luísa a viajarem juntos para fugir do calor do verão lisboeta. Casada, ela recusa com medo de que os vizinhos comentem ao vê-la em companhia de outro homem que não seu marido, mesmo sendo um parente. Ele sugere que os dois viajem de carruagem fechada, quando ela, moça de família, rebate: "Mas então era pior do que estar em uma sala, era abafar numa boceta!"

Grosseria? Imagine a cara do escritor paulista Mário Prata, quando uma vez em Portugal, ao ligar a televisão em um horário no qual as crianças ainda estariam acordadas, se deparou com a exibição do filme "A boceta de Pandora"!

Levou um susto! Filme pornô aquela hora? Que nada! Era um clássico do cinema mudo. O problema é que boceta em Portugal é caixa. Por isso a recatada Luisinha reclamou de viajar em uma carruagem fechada, 'era como abafar em uma caixa'.

Pior foi uma amiga, que em visita a Guimarães, cidade onde Portugal começou, resolveu comprar um souvenir. Entrou em uma loja e pediu um broche.

- Ah, minha filha, aqui não se faz isso, não – respondeu o senhor que tomava conta do lugar, muito constrangido.

Ela não entendeu nada. Quando voltou para casa, comentou o episódio com amigos brasileiros, que vivem na terrinha. A risada foi geral. Broche, em Portugal, é o popular boquete brasileiro! Quem quiser comprar o nosso broche por lá, tem que pedir por um alfinete, ora pois!

quarta-feira, fevereiro 14, 2007

No banco de trás

Tive alguns pesadelos hoje. A noite foi angustiante. Talvez por isso esteja até agora com uma sensação tristonha no peito, na cabeça, nos olhos alagados e ardidos...De manhã, saí de casa assim e busquei um táxi para ir ao trabalho. Quase véspera de Carnaval, um calor danado, encontrei um carro com as janelas fechadas e o ar-condicionado ligado. Entrei e percebi que o motorista fungava. Pensei imediatamente: "Ai, não. Lá vou eu passar o Carnaval resfriada novamente!". Abstraí, abri meu livro e vez ou outra percebia a gripe do motorista, que me interrompeu.

- Moça, desculpa por estar chorando.

Senti-me uma energúmena. O senhor português não estava gripado. Ele estava profundamente triste. Chorar, para mim, é normal. Mas existem situações mais tristes ainda, em que você chora de repente, sozinho, sem controle. Eu já chorei dirigindo, já chorei mergulhando (muito perigoso. Na prática e sem ter outro jeito, comprovei que tinha aprendido a lição de como desembaçar a máscara nas profundezas do oceano)....

Lembrei agora que também já chorei dentro de um táxi, por horas, no banco de trás, tentando ser silenciosa. Daquela vez, o motorista percebeu, mas foi discreto. Despediu-se de mim, sinceramente desejando o melhor e só completando: "Não fica triste, não. Tudo vai melhorar amanhã".

Então, me senti cúmplice do senhor. Perguntei o porquê das lágrimas.

- Eu perdi a coisa mais importante da minha vida. Meu filho. Ele foi assassinado.
- Mas como?, indaguei assustada e comovida.
- No Hospital de Bonsucesso. Teve uma febre e foi ver o que era. Nem resfriado estava. Dois dias depois, me avisaram que ele estava morto!
- ....
- no Hospital de Bonsucesso, onde ele nasceu há 43 anos. Lá ele nasceu, lá ele morreu. Lá ele veio ao mundo e lá tiraram a vidade dele. No Hospital de Bonsucesso.
- mas como? o que aconteceu?
- ninguém me explicou. Mas tenho certeza de que fizeram isso para roubar os órgãos..
- e quando foi isso?
- vou ao São João Batista no domingo, vou visitá-lo lá; é onde ele mora agora. Há onze meses...

Eu não sabia o que dizer. "Faz quase um ano", pensei. E ele me contava a história com como se tivesse sido ontem. Com carga dramática, leve desconexo, quase entre soluços. Muita dor. E lá estávamos nós. Agora, os dois chorando; dois desconhecidos, dentro do táxi, numa quarta-feira de sol, às lágrimas, juntos. Abri meu livro aos poucos, constragida por talvez não parecer solidária à dor do motorista. Eu só queria esquecer. Mas não consegui me concentrar. Se já estava angustiada, caí nas profundezas. Eu, com meus pesadelos. E tantos outros com os seus.

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Bonitinho foi abrir meu e-mail pessoal e encontrar a mensagem de um anjinho (já falei sobre ele neste blog), desejando muito amor no meu coração neste Valentine's Day - o dia internacional dos apaixonados. É hoje e não ia lembrar se não fosse o anjo. Antes de qualquer coisa: anjo não tem sexo! A mensagem foi totalmente desprovida de segundas intenções.